28 de maio de 2012

tombées du camion, trouvées dans les passages

Há quem se empenhe em recolher coisas e imagens "caídas do caminhão", esquecidas nas gavetas, perdidas no tempo. Esse trabalho é, na verdade, uma espécie de resgate. É uma oportunidade que as coisas, souvenirs improváveis, têm de existir novamente. O encanto generoso de resgatar coisas tombées du camion, está em torná-las visíveis e possibilitar que alguém as encontre e as actualize, conferindo-lhes um novo significado a partir da apropriação da sua estética e materialidade para criar novas poéticas visuais. 
A artista brasileira Cristina Guerra já há alguns anos trabalhou com a recolha de retratos descartados de pessoas desconhecidas, ressignificando, em sua obra, as fisionomias e o estatuto social do anonimato das imagens para abordar a questão da identidade.


O argentino Pablo Aguirre tem também um interessante projeto com fotografias encontradas por ele nas ruas de Buenos Aires. Ele não escreve nada sobre as imagens, tampouco investiga as suas origens ou as histórias dos retratados (mas agradece por qualquer informação que lhe chegue e, inclusive, já tem informações sobre alguns dos retratados). A graça do projeto está na natureza das imagens, que se tornam poesia no intervalo entre o momento em que foram abandonadas ou perdidas e o momento em que foram encontradas. 
Na mesma linha, há também o look at me. O projeto teve início em 1998 a partir de fotografias encontradas nas ruas de Paris por Frederic Bonn e Zoe Deleu. 
E por falar em Paris, parece que essa cidade é o paraíso das coisas perdidas no tempo e no espaço, porque parece que há sempre alguém interessado em encontrá-las. Uma prova disso são os expressivos marché aux puces e as tantas lojas de objetos usados e insólitos em diversas ruas e passages da cidade. A loja tombées du camion é uma delas. Recheada de  bonecas, botões, caixinhas, fotos antigas e mais um monte de miudezas, a loja tem um aspecto muito curioso. 
Outro lugar interessante de Paris e especializado em fotografias antigas é a images & portraits. A loja, que é também um estúdio fotográfico, se dedica à venda de fotografias anônimas e retratos de desconhecidos. É possível encontrar desde cartes de visite até photomatons e polaroides, além de câmeras fotográficas antigas. 
Esse mundo de imagens e objetos perdidos e achados é tão fascinante que seguir as suas pistas é como uma caça ao tesouro. Seja para colecionar, guardar como lembrança, oferecer, vender, expor, tomar  como objeto de estudo, usar em trabalhos artísticos, etc., há tanto por descobrir... 

Fotos encontradas | www.fotosencontradas.com.ar

Look at me | look-at-me.tumblr.com

tombées du camion | Aline Soares

tombées du camion | Aline Soares

images & portraits | Aline Soares

images & portraits | Aline Soares










23 de maio de 2012

lhasa de sela | anywhere on this road

Já não me lembro em que ocasião ouvi Lhasa de Sela pela primeira vez, mas confesso que fiquei muito entusiasmada. Gostei de imediato das músicas, da sua voz e presença forte, magnética. Depois de ouvir e ver um pouco mais de Lhasa, fui buscar informações sobre a artista e descobri que ela morreu em 1 de Janeiro de 2010, ainda muito jovem, vítima de câncer. Lhasa de Sela teve tempo para poucas canções, porém muito expressivas, com algumas letras lindíssimas e arranjos cuidadosos. Fiquei triste pela vida e talento interrompidos, e por saber que não haverá outras canções. Os três álbuns que a cantora lançou são daquelas coisas que eu preservo como aquele tipo de brinquedo que a gente gostava tanto quando era criança que pouco usava para não estragar.

I'm going in | Lhasa de Sela

Love came here | Lhasa de Sela

Con toda palabra | Lhasa de Sela

La Confession | Lhasa de Sela



ps. porque uma tese também é feita com música...


22 de maio de 2012

eugène agtet, o fotógrafo de paris


Eugène Atget, 1927, Berenice Abbott
© Berenice Abbott/Commerce Graphics, New York 

Reunindo obras da George Eastman House de Rochester provenientes da coleção de Man Ray e de coleções da Fundación Mapfre, de Madri, o Musée Carnavalet apresenta até 29 de Julho de 2012, uma retrospectiva da obra de Eugène Agtet com a exposição de 230 imagens de Paris realizadas pelo fotógrafo entre 1898 e 1927, e mais uma série de fotos de Emmanuel Pottier.
Eugène Agtet é reconhecidamente um dos precursores da fotografia moderna. É o fotógrafo das primeiras décadas da Paris do século XX, período que assinalou profundas mudanças na paisagem da cidade.
Fotógrafo de uma época em que o principal cartão postal da capital francesa ainda não era a Torre Eiffel, Agtet  lançou o seu olhar sobre as ruas, jardins, parques, cruzamentos, pequenos comércios, vendedores ambulantes e cenas urbanas onde as pessoas aparecem muitas vezes como vultos, tirando assim o protagonismo da paisagem humana num período em que a fotografia prestava-se, sobretudo, à retratística. 
"Ter fixado localmente esta evolução é o significado sem paralelo de Agtet que fixou as ruas de Paris vazias, por volta de 1900. Com muita razão, disse-se dele que as fotografava como um local de crime. Também o local do crime é vazio, sem pessoas. O seu registro fotográfico destina-se a captar os indícios. Os registros fotográficos, com Atget, começam a tornar-se provas no processo histórico" (Benjamin, 1936, p.87-88).
Ator e também pintor, foi na fotografia que Eugène Atget encontrou a sua melhor forma de expressão. Carregando a sua pesada câmera, de cerca de 15 quilos, pelas ruas de Paris, Atget transformou a cidade em imagens que serviram como modelo e inspiração para muitos artistas realizarem as suas obras e como documentos visuais que despertaram o interesse de instituições como o Musée Carnavalet, museu que salvaguarda a história de Paris e que se tornou um dos principais clientes do fotógrafo, comprando boa parte de sua produção.

Au Tambour, 1908, Eugène Atget, Tirage sur papier albuminé Paris© Eugène Atget / Musée Carnavale

A obra e o olhar de Agtet sobre Paris influenciaram fortemente outros fotógrafos da cidade, como Emmanuel Pottier, seu contemporâneo, praticamente desconhecido, além de artistas surrealistas, como Man Ray, que também acabou por adquirir muitas das fotografias de Atget. Nesse percurso, é imprescindível assinalar a importância do trabalho de Berenice Abbott, fotógrafa nova-iorquina assistente de Man Ray, que recolheu provas e negativos fotográficos de Agtet, material que ganhou notoriedade em 1927 com a exposição "La Revolution Surrealiste", comissariada por Man Ray.

Angle des rues de Seine et de l’Échaudé,
6e arrondissement, 1924, Eugène Atget
Tirage sur papier albuminé mat Paris, 
© Eugène Atget / Musée Carnavalet
 

A exposição é realmente um deleite para os olhos de quem tem a possibilidade de flânerier por Paris e para quem se interessa por fotografia. O melhor é sair da exposição buscando nas ruas da Paris de hoje a antiga Paris e o olhar de Agtet.


Anúncio da exposição, Paris.


p.s.: acabei de encontrar, por acaso, o site da Bibliothèque Nationale de France - Gallica | Bibliotèque numérique, com várias fotografias do E. Atget e com a descrição completa da imagem :) J'adore la France!
 http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/btv1b3100065n