Quando a máquina diz não, ele diz sim. Gosto de ouvir o Tom Zé falar quase tanto quanto gosto de ouvi-lo cantar. E numa dessas vezes que o ouvia falar, escutei aquilo que resume o que venho refletindo sobre a máquina, aparelho ou dispositivo: “a máquina é um sensor estético do sistema, se você faz algo diferente, ela não aceita. A máquina só sabe dizer não”. Sensor estético, diz ele, referindo-se à música - e então, já não estamos dialogando com Foucault, Agamben e Flusser?!
Tom Zé disse essa frase ao relembrar da gravação de uma música em que ele buscava misturar, de modo fora do previsto pela máquina gravadora de som, uma série de violas com outros instrumentos, tudo em “quartas paralelas”, o que tornava a música totalmente dissonante, segundo o compositor. Por isso, a máquina “recusava-se” a aceitar a música. O tal sensor estético do sistema dizia para Tom Zé que aquilo não podia ser gravado como estava a ser tocado pelos instrumentistas, porque não foi previsto pela máquina que tamanha liberdade e experimentalismo pudessem ser desejados e alcançados. O que a máquina quer é que adaptemos a nossa inventividade ao seu jogo programado? Ora, a máquina disse não. E Tom Zé andou dois anos às voltas com ela, até que a programou para dizer sim.
Toc - Estudando o Samba, 1976 | Tom Zé
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