22 de novembro de 2011

Encantos, Encants

Foto de Alessandro Rebel ©  
O Mercat Els Encants Vells é, sem dúvidas, o lugar mais marcante de Barcelona para mim. Mas que tipo de gente, afinal, diz isto de uma feira de velharias de procedência duvidosa e “sem valor”? Um tipo de gente que vê nestas velharias pequenos tesouros de valor inestimável, especialmente nas fotografias.
O Encants marcou-me, particularmente, porque assinalou e aprofundou alguns vincos e interesses que ali, naquele momento, ganharam uma aura de descoberta. Foi somente depois que eu percebi que o interesse por fotografias antigas já era algo latente em mim, e que estava apenas à espera de uma oportunidade para manifestar-se. E manifestou-se lá afetivamente, como um encantamento. Ora, e como poderia ser diferente, se estas fotografias tem o poder de materializar memórias de um tempo e um espaço que não nos pertence, e se estas memórias, que não são nossas, são, antes de tudo, memórias afetivas?
Foi lá, creio eu, que resolvi também assumir a fotografia, e as suas narrativas “vulgares”, como objeto de estudo. Mas a coisa ainda não estava clara.
Ler as dedicatórias nas fotografias e postais, os relatos de férias malsucedidas (Queridas hermanas, aquí hace mucho frío y lluvia... no hemos podido ir ningún día a la Piscina... con eso frío de miedo el “moreno” se me va...), ver as imagens. Tudo parecia-me incrivelmente fantástico, mágico. Sentia-me como uma caçadora de relíquias esquecidas no tempo, entre  páginas amareladas de livros e o bolor de malas e gavetas.

Foto de Alessandro Rebel © 
Foto de Alessandro Rebel © 
Quando voltei à Barcelona, já com algumas coisas mais claras, esperava ansiosamente pelo momento de voltar ao Encants. Lembro-me que quando lá cheguei o bafo quente do verão, em seu último suspiro, fez-me pensar no inferno, mas logo pensei que aquilo poderia ser também um canto menos nobre do céu (e quiça mais interessante), cheio de histórias, de pecadinhos perdóaveis e misérias suportáveis. Desta vez, fui com objetividade, estava em busca de retratos fotográficos com características específicas. Mas não tem jeito, alguns lugares nos tomam, nos possuem. Rapidamente toda a minha objetividade se perdeu,  junto com o meu olhar, logo no primeiro monte de fotografias. A objetividade deu lugar à afetividade. Será que a minha tese tem chances de sair?

Mercado de pulgas

Seguindo a Gran Via de Les Corts Catalanes, ao lado da Plaça de Les Glòries Catalanes, entre a Sagrada Família e a Torre Agbar, está o Mercat Els Encants. Este mercado de pulgas não está no roteiro turístico “oficial”, e eu tive a sorte de o conhecer através de um amigo, o Alessandro Rebel.
Nos Encants, encontra-se todo tipo de objetos curiosos, antigos e novos. Caixas de música, câmeras fotográficas antigas, discos de vinil, selos, ímãs, fotografias pessoais, carimbos, cartões postais, brinquedos, ferramentas, roupas, sapatos, buginganas sem utilidades, outras que podem ser incrivelmente úteis... O Encants está aberto, a partir das 8h30, todas as segundas, quartas, sextas e sábados (menos se for dia de La Mercé). Os comerciantes já começam a se retirar por volta do meio dia, e como aquilo é uma imensidão, vale a pena chegar mais cedo. Registrar imagens do mercado não é recomendado, mas regatear sim, e é inclusive esperado! 






1 comentário:

Lisa Valéria disse...

Minha amiga....que texto apaixonante! Não vês?! Já estás a escrever a tese - tenho certeza que está OBJETIVA mas com afeto..... :) muito afeto!
De certa forma, mesmo agora distante, fico aqui cheia de por ter participado um pouco desta sua grande descoberta - a fotografia.
A primeira máquina (de gente grande!!), as primeiras fotos com o saudoso Miguel, e outras tantas....idiossincrasias de um ano recheado de histórias e que fiará na memória.....poética e afetuosa.

ps: vamos marcar um café com afeto?
beijo, Lisa